“É pelo uso, socialmente adequado, que a propriedade é legitimada. A consequência relativa ao descumprimento das obrigações que incidem sobre o proprietário é a desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública, para o caso dos imóveis urbanos, ou da dívida agrária, para os rurais.”
Assim o ministro Fachin resume sua decisão, seguida por todos os ministros, em relação a um pedido da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil para declarar inconstitucional trecho da Lei da Reforma Agrária de 1993, que prevê a desapropriação de propriedades rurais, mesmo que sejam produtivas.
O motivo para o pedido é que o Art. 185 da Constituição deixa clara a impossibilidade de desapropriação de terras produtivas:
Art. 185. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:
I – a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra;
II – a propriedade produtiva.
Parágrafo único. A lei garantirá tratamento especial à propriedade produtiva e fixará normas para o cumprimento dos requisitos relativos a sua função social.
O ministro interpretou o parágrafo único do artigo como indicativo que a produtividade da propriedade é uma condição necessária, mas não suficiente para que ela cumpra sua “função social”.
As garantias fundamentais apresentadas no Artigo 5º da Constituição já traz esse grande “mas”, logo após definir o direito de propriedade:
“XXIII – a propriedade atenderá a sua função social”
No caso da propriedade rural, a Constituição define a “função social” como:
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I – aproveitamento racional e adequado;
II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”
Perceba o nível de subjetividade dos termos: “racional e adequado”, “bem-estar”…
Em outras palavras, não existe direito de propriedade no Brasil, mas sim uma espécie de cessão de direito, dependente do uso “correto” dessa propriedade para o “bem coletivo”, demonstrando o quanto a Constituição brasileira foi influenciada por uma visão socialista.
O direito à propriedade é a base do sistema capitalista de livre mercado, promotor de prosperidade e liberdade. Se ao invés de garantir tal direito, o Estado se apresenta como beneficiário último dele, nos aproximamos do socialismo arbitrário e promotor da pobreza.
No ano passado, o ministro Barroso deu mais um passo na insegurança jurídica, impondo a criação de comissões de mediação para casos de desocupações coletivas, depois de ter suspendido por mais de ano a possibilidade de qualquer despejo, por conta da pandemia. Ou seja, o que já era difícil e demorado, ficou ainda mais difícil.
O resultado dessa política é a perda de eficiência do mercado, com encarecimento dos custos para todos: propriedades formam a base de garantias do sistema financeiro. Se é mais difícil garantir esse direito, aumenta o risco para emprestadores, aumentando o custo para tomadores de recursos. Além disso, a incerteza afasta investidores.
No final, todo mundo fica mais pobre, porém, burocratas concentram mais poder. Não é esse o objetivo do socialismo?
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